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Crítica: Garota de Fora – ★★★★☆ (2018)

Você se lembra de sua época de ensino médio, de seus amigos de escola, sua sala e seus professores? A adolescência é um período sempre propício para a formação de panelinhas ou grupinhos e o que delimita esses grupos geralmente é o que as pessoas têm em comum. Se todos num grupo são iguais, logo, os de fora são diferentes. Ser um aluno de fora que acaba de chegar numa sala nova por conta de uma transferência sempre foi uma experiência difícil para mim, afinal a timidez e dificuldade em socializar na adolescência são bem grandes. Além do fato de nunca saber se seria bem recebido ou bem zoado.

Mas essa não é a realidade da nova garota na sala, Nanno, uma adolescente que acaba de chegar na escola (a cada episódio ela acabou de chegar numa sala nova). Ninguém sabe de onde a misteriosa menina veio e essa pergunta é tão sem importância que ninguém a faz. Nanno pode ser nova ali, mas sempre está vários passos à frente de todos os seus colegas e professores.

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Em Garota de Fora, uma antologia de thriller tailandesa da Netflix, lançada em 2018, as leis, regras sociais e até mesmo os próprios adultos não têm muita importância. Isso contribui para a quebra de expectativa de que os personagens se comportem de tal ou tal maneira correta para não sofrer consequências ou represálias normais. As consequências das atitudes são, isso sim, planejadas especialmente para o culpado; tudo é fruto das relações que acontecem no episódio, nada muito além disso. E quem vem para julgar, punir os culpados e vingar as vítimas é a garota de fora. 

A série que por muitas vezes faz lembrar Black Mirror e Além da Imaginação traz enredos e personagens diferentes a cada episódio, portanto, tem arcos fechados em si. Apenas com os primeiros episódios já dá pra perceber qual é a pegada da série: uma garota (aparentemente com poderes sobrenaturais) arquiteta esquemas e situações para punir outras pessoas de acordo com o “crime” cometido. Na primeira temporada, percebemos como Nanno (que, parando pra pensar, é a única coisa que sabemos sobre ela, seu nome) mal chega a sujar suas mãos com seus esquemas de vingança, armadilhas criadas e ativadas pelos próprios malfeitores. Ela apenas está ali no meio, observando, no máximo supervisionando para que nada saia do controle. A semelhança com Black Mirror é pelo fato de situações cotidianas de injustiça serem levadas a consequências tardias extremas, e isso nos faz desligar a TV e ficar ruminando o que foi assistido por horas. A violência explícita não é muita, quase tudo fica subentendido, e as maiores angústias seguem sendo produto psicológico. 

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Já na segunda temporada, por muitos episódios, a reflexão sobre a situação não é o foco principal e a violência fica mais explícita. Logo nos primeiros episódios,  percebemos como o roteiro se joga em temas mais adultos, como sexo, gravidez e até violência sexual. Mas faltou uma dosagem, uma medida mais balanceada entre a lição de moral e o chocante. O amadurecimento dos temas poderia ter sido uma aposta interessante se tudo amadurecesse junto, assim como a carismática atriz Chicha Amatayakul que já aparenta estar mais velha. Entretanto, alguns temas são abordados de maneira um pouco superficial e a narrativa não “envelheceu”. 

Na segunda temporada uma nova personagem surge e sua origem é desconhecida. Tampouco sabemos se é uma aliada da justiceira Nanno ou uma inimiga, mas essas questões serão respondidas. A presença desta personagem não abala o objetivo de cada enredo, de forma que ela se encaixa muito bem. O que se pode dizer sobre ela, mantendo os spoilers à parte, é que ela porá o senso de justiça e o peso das vinganças de Nanno em questão. 

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Me pergunto se é apenas para poder questionar as atitudes de Nanno e construir um antagonismo que a segunda temporada é tão mais chocante, com episódios que mais parecem cheios de tortura gratuita do começo ao fim. Até mesmo comecei a questionar as atitudes da adolescente heroína. Se essa hipótese for real, espero um maior equilíbrio na próxima temporada, porque não quero ver a vingadora acabar se tornando uma vilã. Além disso, espero também o desenrolar da relação entre Nanno e a nova personagem, mas sem que isso exija ocupar alguns episódios, assim como foi de maneira acertada a segunda temporada.

A adolescência e a fase escolar podem ser períodos sombrios, as consequências das nossas atitudes sempre parecem estar distantes o suficiente para não precisar se preocupar com elas. Se você foi o adolescente que praticou bullying ou coisa pior, não desejaria que a novata estivesse em seu caminho. Se você foi a vítima, talvez desejasse que ela estivesse em sua sala para te vingar. Eu sei que não gostaria de estar no lugar dela, porque punição e vingança podem ser mais atraentes e violentas que o próprio crime.

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Sobre Emerson Dutra

Um psicólogo que tem o mundo nerd como seu guarda roupa para atravessar para uma Nárnia que é mais divertida, interessante e justa que nossa realidade compartilhada.

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